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sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

O MORTO VIVO


Conta-se que, na época da construção do Açude do Choró, muita gente que ali prestava serviço para garantir o seu sustento e de sua família, trabalhava sem as menores condições de serviço. E, além do mais, a vida era difícil, pois a ciência e as tecnologias ainda não haviam chegado ao sertão do Ceará.
Pois bem, é neste contexto de seca e desespero que começa a nossa história. Sem as devidas ferramentas de trabalho, muitos homens e mulheres adoeciam e chegavam a falecer com muita facilidade por falta de médicos, recursos, alimentos e atendimento apropriado. Mas, a morte, nem sempre é fiel nas suas cobranças... E a ignorância ajuda ainda mais esta injustiça da vida cometida pela morte, que diga de passagem, é justa e honesta com todos os seres viventes.
Assim, devido à poeira da terra seca, as pessoas sofriam uma morte meio estranha. E contam-se, os mais velhos, que muitos foram enterrados vivos, pois mortos assim pareciam. Porém, uma senhora que ali trabalhava, chegou a falecer, mas, sempre disse aos seus familiares e amigos que gostaria de ser enterrada no cemitério de Quixadá.
Sem transporte, pois não havia ainda, esta facilidade que encontramos hoje, seus amigos colocaram-na numa rede, e traspassaram uma vara em seus punhos e começaram o cortejo, a pé, em busca da cidade de Quixadá.
Enquanto transportavam, o corpo da pobre senhora, rezavam o terço, cantavam benditos e pediam a Deus a misericórdia para aquela pobre alma. Vale relembrar, aqui, que, para um sepultamento, vestia-se o defunto com uma mortalha marrom de Opala, amarrava-se a cabeça do infeliz com um pano para que não abrisse a boca, e as mãos para, que este, não se pegasse as coisas materiais no momento de sua jornada aos Céus ou ao Purgatório, ninguém sabe até hoje.
Pois bem... Assim, caminharam os quilômetros a fio, carregando o corpo da pobre senhora, revezando aqueles que a carregavam nos ombros, e assim manterem a força de rezar e cantar os benditos a todo pulmão. Porém, na realidade, a pobre e infeliz senhora, sofredora desde o nascimento, não estava morta, simplesmente, como muitos outros, havia desmaiado devido o sol quente e a poeira nos pulmões.
Em certo momento da viagem, aquela que todos haviam chorado a morte, acordou do desmaio, e sem poder falar e sem poder levantar-se, pois, estava amarrada a rede que a trazia, entrou em desespero, mas não podia fazer nada, e clamava em seus pensamentos as graças de Nossa Senhora das Dores e de São Francisco do Canindé, que é mais perto, e o socorro demora menos a chegar.
Não sabemos se por milagre ou pelo balançar da rede, ao chegarem à porta do cemitério de Quixadá, a senhora sentou-se a rede, sem falar, ainda, pois não havia desamarrado o lenço que a impedia de abrir a boca.
Resultado: largaram a infeliz no chão e saíram correndo em desespero pelas ruas, da ainda pequena cidade de Quixadá, e a população que esperava o sepultamento, ao ver a defunta de pé, correm a gritar e a chorar, agora não pela dor de ter perdido um amigo ou um ente querido, mas sim de desespero em ver UM MORTO VIVO.

Autor: Davi Moura Nobre
Professor da Rede Estadual de Ensino do Ceará

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